NFT’s on the rocks
--
Há tanto para dizer sobre NFT’s aka Non-Fungible Tokens.
É um assunto simples e ao mesmo tempo complexo porque envolve conceitos que tomamos como garantidos e outros que nem por isso.
Vou tentar explicar estes conceitos o melhor que conseguir sem entrar em especificidades técnicas nem grandes juízos de valor.
B de Blockchain
Quando falamos de NFT’s temos de começar por referir que estes existem no mundo digital através da implementação de um outro conceito, blockchain.
Um senhor chamado Satoshi Nakamoto (que ninguém sabe quem é, nem sequer se é uma pessoa ou um grupo) apresentou em 2009 um sistema de base de dados distribuída com mecanismo de consenso.
Pensa numa base de dados como se fosse uma folha de excel.
Agora pensa que cada pessoa tinha no seu computador uma versão desse mesmo excel.
Qual é o excel que tem a versão correta?
Para chegarmos a uma resposta acerca de qual é a versão correta e verdadeira temos de ter aquilo a que se chama de mecanismo de consenso.
Esse mecanismo é o que permite que pessoas desconhecidas entre si e espalhadas por todo o mundo consigam concordar no que é registado na base de dados distribuída por todos os computadores que têm acesso à mesma.
Uma única fonte de verdade distribuída por todos os computadores.
Tudo isto é feito de forma automática, à distância, sem existir a possibilidade de apagar registos, apenas a criação de novos e sem uma figura ou instituição centralizada, a qual se falhar, falha todo o sistema de registos.
Uma base de dados distribuída é portanto mais robusta a vulnerabilidades e a falhas.
O importante nisto é que o senhor Nakamoto criou através de criptografia e assinaturas digitais, o conceito de escassez digital.
Um objeto único e irrepetível mas… digital.
T de Token
Ainda não consegui encontrar um termo adequado que traduza o conceito de token para a nossa língua mas vou tentar arranjar qualquer coisa.
Um token é um símbolo ou objecto simbólico que permite o acesso a algo.
O dinheiro é um token, um bilhete pode ser um token, uma ficha do casino pode ser um token, os euros em cartão continente são um token.
Se tens o token certo para o jogo certo, tens acesso para participar no jogo a que esse token dá acesso.
Se tens token jogas se não tens ficas de fora.
F de Fungível
Por outras palavras: imagina que tens um objecto… sei lá… uma guitarra.
A tua guitarra está impecável, afinada, enfim… como nova.
Agora imagina que vais com a guitarra à tua loja de instrumentos preferida e pedes para trocar a tua guitarra por outra da mesma marca e modelo.
Qual achas que vai ser a resposta do Sr. Manuel?
Exacto…. não vai aceitar a troca porque não considera que as guitarras sejam equivalentes ou que a equivalência não é perfeita.
As guitarras são bens não fungíveis ou infungíveis.
Já para outro objecto, por exemplo, uma nota de 10 euros, o Sr. Manuel se estiver bem disposto troca a tua nota de 10 euros por outra que ele tem lá na gaveta. E até vai mais longe, dá-te duas notas de 5 euros e tu aceitas a equivalência de bom grado. A esta característica de equivalências chama-se fungibilidade.
O caso de uso de NFT’s na música
Podemos aplicar estes conceitos na criação e distribuição de conteúdos digitais únicos, seja a um ebook, a uma imagem digital, a um video e a… já adivinhaste!?, um ficheiro audio (mp3, wav, flac, etc).
Existem atualmente várias plataformas que permitem a criação de NFT’s associados a ficheiros (assinados digitalmente) sejam de audio ou de outro tipo numa rede blockchain.
É o equivalente a ter uma cópia de um CD, vinil ou cassete mas em formato digital.
O processo até agora é: o artista grava a música, o editor pega na gravação e faz cópias e a distribuidora faz chegar as cópias ao cliente final.
Na prática o que muda é que o formato da obra não tem de estar associado a um objeto físico (como um CD ou disco vinil) o que abre um mundo novo de oportunidades que o digital nos oferece.
É possível por exemplo aplicar estes conceitos também ao streaming, o que significa que é possível a distribuição imediata e automática de royalties por cada segundo de música tocado.
Num sistema verdadeiramente distribuído apenas serão necessários os seus próprios participantes, ou seja, quem faz a música e quem a ouve.
Casos de sucesso
Nesta altura a hype à volta dos NFT’s é grande até porque vários artistas já conseguiram o dinheiro para a reforma, mas até que ponto estes casos de sucesso se aplicam a artistas mais desconhecidos?
Já várias jogadas de marketing semelhantes se fizeram no passado (álbuns grátis — NIN, paga o que quiseres — Radiohead) e os primeiros beneficiários são sempre quem já tem uma vasta audiência.
Aos outros resta entrar no barco e ver a vista.
A mim, isto parece-me mais com o jogar no euromilhões, onde a probabilidade de acertar é ínfima.
Mas a tecnologia está cá e é para aproveitar o máximo possível, para nosso proveito e para nos facilitar a vida, no entanto, o que sempre foi difícil e continua a ser, é ter quem nos oiça.